No que se refere a convenções de trabalho nos Estados Unidos, esta foi deveras incomum: 68 trabalhadores vieram de St. Louis em ônibus alugados; cem partiram da cidade de Nova York e 180, de Alabama, Georgia e as duas Carolinas. Cinquenta voaram de Los Angeles e duas dúzias de Seattle.
Eles não eram carpinteiros bem pagos ou metalúrgicos do setor automotivo se dirigindo às suas convenções anuais, com esperança de participar de uma rodada de golfe. Em vez disso, eram trabalhadores do setor de fast-food — 1.200 deles — de McDonald’s, Burger King e outras cadeias, ávidos para conseguir sua maior ambição: a criação de um salário mínimo de US$ 15 por hora para os quatro milhões de empregados do setor.
Amontoados durante um fim de semana em um centro de exposições na periferia de Chicago, muitos usavam corajosamente camisetas com slogans “Valemos mais” e “Aumente para US$ 15”.
— Se ganharmos os US$ 15, isso mudará minha vida — disse Cherri Delisline, de 27 anos, uma mãe solteira que ganhar US$ 7,35 por hora, após dez anos trabalhando como caixa de um McDonald’s em North Charleston, na Carolina do Sul. — Ganho tão pouco que é difícil fechar o mês, e tive que voltar a viver com minha mãe.
Foi de longe a maior reunião de trabalhadores no segmento de fast-food, e foi em boa parte organizada pelo Sindicato Internacional dos Trabalhadores em Serviços (SEIU, em inglês), uma poderosa entidade com dois milhões de membros, conhecida por sindicalizar empregados de hospitais, enfermeiros, acompanhantes e pessoal de limpeza. Mary Kay Henry, a presidente do sindicato, afirmou que o SEIU abraçou a causa dos empregados de fast-food de elevar o salário mínimo e combater a desigualdade de renda.
Experiente em lidar com uma plateia, Mary disse em sua intervenção:
— Uns poucos egoístas no topo estão usando o poder deles para manter os salários baixos, independentemente do quanto isso atinja famílias e comunidades em todo o país.
Ela criticou os diretores executivos de McDonald’s e Yum Brands, grupo proprietário de KFC, Taco Bell e Pizza Hut, por receberem compensações salariais de mais de US$ 10 milhões por ano. Eles ganham num dia duas vezes mais do que muitos empregados de fast-food recebem em um ano.
Glenn Spencer, diretor executivo da Força-tarefa da iniciativa de liberdade da Câmara Americana de Comércio, afirmou que o SEIU não estava investindo US$ 15 milhões na campanha do piso salarial para o setor de fast-food meramente por bondade.
— Não se põe esse volume de dinheiro apenas por um sentido de altruísmo — disse ele. — Há um plano de como isso (esse apoio) se transformará em novos membros.
O SEIU realmente espera sindicalizar multidões de empregados da indústria de fast-food, mas esses esforços se mostraram difíceis uma vez que a maioria desses trabalhadores está espalhada entre milhares de restaurantes que operam sob contratos de franchise. Além disso, tanto as franchises quanto as redes de fast-food provavelmente lutarão com unhas e dentes contra a sindicalização.
A convenção de dois dias, com 150 mesas espalhadas pelo centro de exposições, revelou o crescimento da campanha desde novembro de 2012, quando 200 empregados fizeram um dia de greve em 60 restaurantes de fast-food em Nova York. Em sua paralisação mais recente ao meio-dia, os empregados abandonaram os restaurantes em 150 cidades nos Estados Unidos, com protestos de solidariedade em 30 países. Cada vez mais a sindicalização entra na pauta de reivindicações; o slogan do movimento se tornou: “US$ 15 e um sindicato”.
— Minha percepção é que o SEIU reconheceu que, para tirar o movimento sindical do marasmo em que se encontra hoje, será preciso mais do que um impulso individual de organização local — que este é o momento para fazer um esforço em grande escala e com alta visibilidade para mudar o clima a favor do trabalho — disse Janice Fine, professora de Relações Trabalhistas da Universidade de Rutgers. — E eles escolheram um setor como o de fast-food cujas condições são bem conhecidas: baixos salários, jornadas meio expediente, horário irregular e geralmente sem benefícios.
Numa jogada de alto risco, os trabalhadores de fast-food, apoiados pelo SEIU, levaram vários casos diante do Conselho Nacional de Relações de Trabalho, demandando a seu conselho geral que declare o McDonald’s coempregador com os restaurantes para os quais cede sua marca por meio de contratos de franchise. Se o conselho acolher o pedido, abrirá uma porta para que o SEIU sindicalize não apenas três ou cinco McDonald’s por vez, mas dúzias e talvez centenas.
Os grupos empresariais se opõem a essas mudanças. Spencer afirmou que se o conselho adotar uma interpretação mais geral, “então obrigará a corporação a se sentar à mesa e negociar” com o sindicato. Já os dirigentes do SEIU querem que o McDonald’s e suas cadeias sob contratos de franchise não impeçam os esforços de sindicalização.
O McDonald’s não quis comentar a convenção, realizada próxima a sua sede. Alvo principal das críticas e do movimento de sindicalização, o McDonald’s informou que provê um salário e benefícios competitivos para muitos trabalhadores. A Associação Nacional de Restaurantes repetidamente criticou o movimento de um salário mínimo de US$ 15, afirmando que resultaria no aumento de preços nos cardápios e demissões.
FONTE: O Globo, 29 de julho de 2014; fetraconspar.org.br